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terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Especialista analisa aumento de valor de imóveis retomados por bancos

Com a crise econômica, o valor dos imóveis retomados pelos bancos por inadimplência no financiamento disparou. O estoque de imóveis em posse das instituições saltou de R$ 6,5 bilhões, em novembro de 2015, para R$ 9,8 bilhões, no mesmo mês de 2016. De acordo com dados do Banco Central, a alta foi de quase 50%. E, embora não haja estatísticas oficiais do mercado de leilões, a Federação Brasileira de Leiloeiros Públicos Oficiais (Febralei) estima que a oferta de imóveis em leilões tenha crescido 80% nos últimos dois anos.

Na Caixa Econômica Federal, que concentra 70% do crédito imobiliário no Brasil, o total de imóveis retomados subiu de 8.775, em 2015, para 15.881, em 2016 – uma alta de 81%. Diante disso, a Caixa firmou parceria com o Conselho Federal de Corretores Imobiliários (Cofeci) para tentar escoar o seu estoque, que atualmente soma 24.585 unidades.

Para esclarecer como a situação chega a ponto da retomada do imóvel, o vice-presidente da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH), Wilson Cesar Rascovit, observa que muitas pessoas que financiam um imóvel não conseguem entender como funciona o financiamento imobiliário, especialmente quando está ligado ao Sistema Financeiro da Habitação (incluindo o programa Minha Casa Minha Vida). 

“A lógica seguida pelos bancos, públicos ou privados, é simples: o mutuário contrai um empréstimo financeiro, mediante o pagamento de juros, e oferece o imóvel que acabou de adquirir como garantia da dívida. Ou seja, a atividade comercial desenvolvida pelas instituições financeiras é empréstimo de dinheiro, a juros, se o empréstimo deixa de ser pago, o banco executa o contrato e – muitas vezes – fica com o imóvel como forma de pagamento”.

De acordo com o vice-presidente da ABMH, nesse tipo de operação, o agente financeiro não vende, financia ou retoma a unidade habitacional. “A venda é feita pelo então proprietário do bem, o financiamento é concedido ao comprador (pessoa física ou jurídica), a unidade passa diretamente para o nome do agora mutuário (comprador/devedor), que, em seguida, oferece o recém adquirido imóvel em garantia da dívida. Em caso de inadimplência, o banco/credor não ‘retoma’ o imóvel, pois ele nunca foi o proprietário, o que ocorre é a execução do contrato, e o leilão do bem. Quando não há arrematante, o credor fica com a unidade em pagamento da dívida.”

Qual a melhor forma de evitar a perda de seu imóvel?

Segundo a Lei 9.514/97, que regulamente a alienação fiduciária de bens imóveis no Brasil, a partir da primeira parcela vencida e não paga, o credor pode iniciar o procedimento de execução extrajudicial do contrato de financiamento, como conta Rascovit. “Entretanto, se houver previsão contratual diferente, vale a regra mais benéfica ao consumidor. A maioria dos contratos prevê que a execução se iniciará a partir da terceira parcela em atraso”.

Um dos motivos para a retomada dos imóveis é a utilização da alienação fiduciária, que é utilizada pelo sistema financeiro como forma de garantia do pagamento de empréstimos de dinheiro. “O mecanismo foi implantando no Brasil em 1997, com a Lei 9.514, e ganhou força nos anos 2000. Atualmente, além do financiamento para aquisição do próprio imóvel, o proprietário de unidade livre de quaisquer ônus pode oferecê-la em garantia de pagamento de empréstimo financeiro de qualquer natureza (empréstimo pessoal, por exemplo)”, completa Wilson.

Nesse sistema, os direitos de propriedade são desmembrados. O consumidor tem a posse direta do imóvel (pode fruir, usar e gozar), enquanto o credor financeiro tem a posse indireta do bem (que consiste no direito de dispor do imóvel). “Trocando em miúdos, o mutuário pode utilizar a unidade como quiser, inclusive alugar ou emprestar (respeitadas as limitações legais, tais como os direitos de vizinhança e as regras condominiais), mas não tem o direito de aliená-la, ou seja, não pode vender, doar, partilhar ou a oferecer como garantia de algum empréstimo, por exemplo”, explica o vice-presidente da ABMH.

Segundo ele, a constituição da alienação fiduciária é feita automaticamente, quando o comprador assina o contrato de compra e venda com financiamento imobiliário do imóvel, ou o contrato de empréstimo com garantia de alienação fiduciária. “A partir daí, se atrasar com o pagamento de alguma prestação, o credor pode iniciar o procedimento de execução extrajudicial do débito.”

Antes que a situação chegue neste ponto, uma das alternativas apontadas pelo vice-presidente da ABMH é tentar negociar a dívida. “Caso não haja essa possibilidade, o mutuário pode solicitar uma revisão do valor das prestações na via judicial, para que se adéque à sua realidade financeira. O mais importante em todos os casos é tomar alguma atitude o mais breve possível.”

Se o caso chegar à execução, a instituição credora tem a obrigação de notificar o devedor pessoalmente a pagar o débito em 15 dias. “Findado esse prazo, a propriedade do imóvel é transferida para o nome do credor financeiro, que, em seguida, é obrigado a levar o bem a pelo menos dois leilões públicos. Se a unidade não for arrematada em algum dos leilões, o credor fica com ela e a dívida é integralmente quitada”, alerta Rascovit.

Além dessas obrigações, o procedimento de execução (e leilão) deve observar alguns requisitos, sob pena de ser declarado nulo, segundo Wilson. “Quando o financiamento/empréstimo é tomado por mais de uma pessoa (um casal, por exemplo), todos os devedores devem ser notificados pessoalmente para pagar a dívida em 15 dias. Além da notificação inicial, o devedor – ou devedores – deve ser notificado sobre as datas dos leilões, e o imóvel não pode ser levado a leilão preço inferior a 60% de sua avaliação de mercado. Após os leilões, o credor deve repassar ao devedor a diferença entre o valor da arrematação e da dívida. Se não houve arrematante, pode-se pleitear a devolução da diferença entre o valor de mercado e da dívida.”

Como evitar que o imóvel seja levado a leilão?

Uma das alternativas é a utilização do FGTS para pagamento da dívida. “Neste caso, é necessária uma autorização judicial, que pode ser conseguida até mesmo pelo Juizado de Pequenas Causas, já que, amigavelmente, a instituição financeira não autoriza a operação. Outra alternativa é vender o imóvel e quitar a dívida, hipótese em que o devedor fica com a diferença entre o valor da venda e do débito. Em terceiro lugar, a saída é propor uma ação judicial para suspender o procedimento de execução”.

De acordo com Wilson Rascovit, quanto mais avançado está o procedimento de execução, mais difícil é suspendê-lo. “De toda forma, mesmo após a conclusão da execução, é possível anulá-la ou, pelo menos, requerer a devolução do valor correspondente à diferença entre o valor do bem e do débito. A ABMH presta consultoria jurídica gratuita aos que passam por essa situação”. 

Todas as regras descritas na Lei 9.514/97 também se aplicam aos contratos vinculados ao Programa Minha Casa Minha Vida. “O que diferencia esses contratos dos demais são situações específicas de concessão do financiamento, tais como valor do imóvel, renda do mutuário, responsabilidade direta da Caixa pelo empreendimento e concessão de recursos, bem como os benefícios que são concedidos pelo governo para fomentar a habitação no país. Os requisitos são pré-contratuais. Uma vez assinado o contrato de financiamento, deve ser observado pelo credor e devedor o rito de execução da Lei 9.514/97”, finaliza o vice-presidente da ABMH.



Mais informações: (62) 3215-7777 ou (62) 3215-7700