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segunda-feira, 6 de abril de 2015

Novo Código de Processo Civil impacta diretamente no Direito Comercial

Em que pese a autonomia do Direito Comercial em relação aos demais ramos do direito privado e público, muitos fatores legais ou de fato que interferem em outros campos do Direito produzem interferência equivalente nas relações comerciais. O novo Código de Processo Civil, recentemente promulgado, apresenta algumas normas com a potencialidade de produzir impacto nas relações jurídicas sujeitas ao Código Civil, ao Direito Tributário e às normas especiais comerciais.

Dentre as mudanças trazidas no projeto, a redação do artigo 63 determina: “É vedada a eleição de foro nos contratos de adesão”.

Os contratos de adesão são usuais não apenas nas relações de consumo, como também se tornam cada vez mais comuns nas relações empresariais que envolvam modelos de contratação fechados. São contratos empresariais, por exemplo, o contrato de franquia, de transporte, de representação mercantil, de compra e venda repetidas para revenda, dentre outros. 

A determinação do novo CPC (ainda que a fixação de cláusulas contratuais seja uma questão de direito material) afasta a possibilidade de contratualmente ser fixado o foro do contrato de adesão, independentemente de sua caracterização como contrato civil ou comercial, o qual poderá ser modificado de ofício pelo juiz.

Outra norma que interessa ao Direito Comercial decorre da previsão do artigo 134 caput e parágrafo 2,º que admite o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, a qualquer tempo. O objetivo da norma proposta é de dotar de celeridade os processos que envolvam pessoas jurídicas nos quais exista a pretensão de responsabilização de sócios ou de administradores, afastando o requisito de exaurimento do patrimônio da pessoa jurídica ou a bastando o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Todavia, a preservação da separação patrimonial entre a sociedade, seus sócios e administradores, é essencial ao sucesso de qualquer investimento de maior porte. A promessa de que os riscos são limitados para o investidor, que parte da convicção de que apenas o patrimônio investido será atingido em caso de insucesso, está na essência do sistema econômico que busca na iniciativa privada o lastro para o financiamento das ações empresariais, tornando tal investimento atrativo e uma alternativa ao investimento via especulação financeira.

A desconsideração da personalidade jurídica aparece no sistema jurídico como forma de afastamento dos benefícios da personificação, notadamente a limitação de responsabilidade que caracteriza a maior parte dos tipos societários, para situações de anormalidade.

A generalização da desconsideração, especialmente no que se refere às dívidas que não sejam tributárias, trabalhistas ou decorrentes da relação de consumo, certamente conduzirá a um desestímulo a que pessoas com maior potencial de investimento sejam tentadas a aplicar seus recursos na atividade produtiva, o que é extremamente prejudicial ao desenvolvimento econômico, e, portanto, social de um país.

Felizmente nossas cortes têm sido bastante parcimoniosas ao aplicar as normas de desconsideração (fora do âmbito do Direito Tributário, do Consumidor, Trabalhista e de tutela do mercado – o que, convenhamos, já cria um ambiente pleno de hipóteses)3.

O novo CPC, em seu artigo 85, altera os critérios da condenação em honorários sucumbenciais, especialmente quando a Fazenda Pública é parte. São fixados percentuais que variam de forma inversamente proporcional ao valor da causa. Pela nova redação, os honorários de sucumbência nas demais causas serão fixados entre 10 e 20% da vantagem pretendida ou obtida pela parte, a depender da dificuldade e da atuação do advogado, enquanto nas ações em que a Fazenda Pública for parte há a fixação de parâmetros diferenciados e de forma geral menos gravosos para a parte sucumbente. 

A fixação de custas judiciais e de honorários tem o potencial de interferir na conduta dos agentes e, a sobre-utilização do Poder Judiciário, de afetar o estágio de desenvolvimento econômico e social de um país4. A previsão do novo CPC, ao mesmo tempo em que propôs um tratamento desigual entre advogados, também estimula o uso do Poder Judiciário em causas que envolvam a Fazenda Pública, já que reduz os riscos relacionados às verbas de sucumbência. A Fazenda tem por reduzido o seu prazo de contestação do quádruplo do prazo para o seu dobro (artigo 183) e a delimitação da aplicabilidade do recurso necessário (artigo 496) em suas demandas.

Ainda no campo das medidas que irão impactar nas empresas, o projeto afasta do autor da demanda o custeio exclusivo de prova pericial determinada pelo juiz, estabelecendo em seu artigo 95, o rateio entre as partes.

No campo das normas procedimentais, a citação e a intimação não estão mais limitadas ao expediente forense (artigo 212, parágrafo 2º), a contagem dos prazos passa a ser por dias úteis (artigo 219)

No universo empresarial, destaca-se também o teor do artigo 246, parágrafo 1º, parágrafo único do novo CPC que determina às empresas de médio e grande porte a criação de endereço eletrônico exclusivo para receber intimações e citações. Essa previsão está em consonância com a disseminação dos processos pelo rito eletrônico. 

Já a proposta do artigo 248, parágrafo 2º é de positivação de algo já consagrado pela prática empresarial, a aceitação de que um vigia ou porteiro de uma empresa, mesmo não tendo poderes de representação, possa receber validamente citações e intimações – a Teoria da Aparência. Acredita-se, porém, que a redação do dispositivo acabará por não confirmar o efeito dos atos processuais em relação à empresa, já que menciona a necessidade de que o funcionário seja o responsável pelo recebimento de correspondências. Portanto, abre a oportunidade de discussão sobre o fato do funcionário atender ou não a esta condição.

Os limites do ato extremo, todavia, provavelmente conduzirão a debates judiciais, já que a continuidade da atividade empresarial não deverá ser afetada (em face precisamente dos múltiplos interesses envolvidos na atividade empresarial, como aquele dos trabalhadores, dos consumidores e fornecedores, além de aspectos de proteção, por exemplo, do segredo industrial e comercial). Os mesmos limites deverão ser considerados na aplicação do artigo 782, III que possibilita a penhora e expropriação dos frutos e rendimentos de empresa ou estabelecimento.

O artigo 861 consagra a possibilidade de penhora das quotas sociais tituladas por sócio devedor de terceiro, assim como das ações de sociedade anônima fechada, delimitando um prazo para que a sociedade realize o procedimento de apuração de haveres do sócio executado e o depósito do valor respectivo. Muito embora o prazo indicado pelo dispositivo seja de três meses da intimação, o disposto no parágrafo 3º relativiza-o diante da necessidade de preservação da viabilidade da empresa afetada.

Os dispositivos aqui analisados, além de outros mais gerais, exigirão dos advogados empresariais um trabalho redobrado para as devidas adaptações nos encaminhamentos processuais disponibilizados ou modificados pela proposta legislativa.

Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Lisboa, Girona, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC e UFMT).

Fonte: Consultor Jurídico

Garantia veicular exige que revisões sejam feitas conforme manual

Antes de mais nada, cabe definir a nomenclatura garantia, que, pelo consagrado autor Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, é “o ato ou palavra que assegura obrigação, intenção, sentimento, prova e segurança”. Trata-se de um documento elaborado para garantir “a autenticidade e/ou a boa qualidade de um produto ou serviço, assumindo, junto ao comprador ou usuário, o compromisso de ressarci-lo em caso de ineficiência ou fraude comprovadas”.

O instituto da garantia surgiu com a necessidade de resguardar o direito do comprador em obter um produto de qualidade. Esse mecanismo foi criado para equilibrar a relação entre vendedor e comprador, uma vez que a regra, a princípio, era condicionada à punição física e até mesmo ligada à religião, pois o Estado não detinha poder para controlar a relação entre indivíduos. Assim, se o vendedor não garantisse a troca ou a manutenção de uma mercadoria vendida poderia até mesmo perder o dedo, a mão ou o braço.

Com a evolução das práticas de comércio, o Estado passou a ter poder suficiente para regrar as obrigações e deveres de cada parte interessada na relação consumerista. E, para convalidar o equilíbrio na venda de um produto, o vendedor garantia a qualidade/quantidade e o comprador, a utilização do produto. Assim, consagrou-se a intervenção do Estado nas relações do setor privado, deixando de existir o poder da Igreja em regrar tais situações. E, até hoje, o mecanismo da garantia mantém o mesmo objetivo da sua iniciação no ordenamento jurídico.

Evolução jurídica

Foi no Código Civil de 1916 (Lei 3.071/1916, revogada pela Lei 10.406/2002), eivado de características individualistas e patrimonialistas, que nasceu o instituto da garantia como regramento jurídico nas relações civis e de consumo. O artigo 1.245, desse código, disciplinava, a título exemplificativo, que, nos contratos, as empreiteiras de edifícios ou outras construções consideráveis seriam responsáveis, durante cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho.

Já o atual Código Civil (Lei 10.406/2002), constituído em pleno estado democrático de direito, dispõe sobre a garantia de forma implícita em seu artigo 445. Nele, “o adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se o bem for móvel e, de um ano, se for imóvel, a partir da entrega efetiva. Em caso de posse, o prazo passa a ser contado da alienação, reduzido à metade”.

Finalmente, em 1990, o instituto da garantia chegou a seu ápice legal com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990). O artigo 26 desse código determinava que o direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em trinta dias, no caso de fornecimento de serviços e de produtos não duráveis e, noventa dias, para serviços e produtos duráveis. Assim, a garantia consagrou-se na legislação brasileira.

Garantia contratual

A garantia contratual está prevista no artigo 50, do Código de Defesa do Consumidor, onde se lê: “a garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito”. Seu parágrafo único determina que o termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada, em que consiste, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor. Além disso, o fornecedor deve entregar esse termo no ato do fornecimento, devidamente preenchido e acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.

Neste caso, o fornecedor garante contratualmente seus produtos e serviços, atendendo às exigências do parágrafo único desse artigo e não poderá, de forma alguma, realizar garantia contratual tacitamente.

Conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, o lapso temporal da garantia legal, possuindo o produto ou serviço garantia contratual, se dará após o decurso do prazo desta última. Assim, fluirá primeiramente o prazo concedido pela garantia contratual e por fim o da garantia legal (trinta dias para os bens não duráveis e noventa dias para os duráveis).

Nos ensinamentos da especialista Claudia Lima Marques, “a garantia contratual é um plus, um anexo voluntário, por isso pode ser concedida mesmo após a assinatura do contrato”. Diferentemente da garantia legal que se inicia a partir da entrega (tradição) no caso de bens móveis e do registro em se tratando de bens imóveis. Ressalta-se que na ocorrência de vício oculto, o prazo começa a partir do momento em que se tem conhecimento do fato/vício.

Tipos de vícios

O Código de Defesa do Consumidor define como sendo vício tudo que torna o produto “impróprio ou inadequado ao consumo a que se destina ou lhe diminua o valor, assim como por aquele decorrente da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária”.

São dois tipos de vícios: o aparente e o oculto. O vício aparente pode ser visto de imediato, ou seja, no momento da aquisição. E o oculto será descoberto futuramente com a utilização do produto. Existem doutrinadores que denominam vícios ocultos como sendo redibitórios, pois possuem a mesma definição.

Garantia estendida

A garantia estendida vem sendo praticada com maior frequência nas relações de consumo atual, visto que o consumidor deseja garantir ao máximo os produtos e serviços que adquire.

Ela se constitui numa terceira opção para o consumidor, pois não configura a garantia legal e muito menos a contratual. É definida como um seguro regulamentado pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), configurando um serviço acessório ao produto que o consumidor adquire no ato da compra.

Existem duas modalidades de garantia estendida. A primeira estende o prazo da garantia contratual após o vencimento e possui a mesma cobertura. A segunda modalidade é a complementar e se inicia juntamente com a contratual, porém cobre situações que a garantia contratual não abrange.

Conforme regramento da Susep, o artigo 3º, da Resolução 122, de 2005, aduz que “o contrato de seguro de garantia estendida poderá prever as seguintes modalidades de pagamento da indenização ao consumidor final: dinheiro, reposição e reparo do bem”.

A garantia estendida só pode ser contratada, não sendo possível na forma presumida, uma vez que está neste caso consolidada à responsabilidade civil do fornecedor. Também não poderá configurar venda casada, sendo proibida legalmente pelo artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor.

Por outro lado, qualquer fabricante ou montadora pode vir a público, a qualquer momento, em defesa da sua marca, estender a garantia de seus produtos e serviços. Essa iniciativa gerou uma nova modalidade de garantia, já que não se enquadra na legal, na contratual e muito menos na estendida. 

Recall: outra modalidade

O recall ou convocação, palavra inglesa assim traduzida no Dicionário Aulete, é um mecanismo, que tem sido utilizado pelas montadoras/fornecedores para convocar os consumidores de seus produtos, quando constatado um defeito de fabricação. Esta ação é realizada por meio de anúncios veiculados na imprensa, permitindo a correção do problema antes que cause acidentes, prejuízos ou danos.

Entretanto, o recall pode ser feito antes de a lesão ocorrer, como forma preventiva ou depois da consolidação do ato como sendo repressiva. Na prática tem sido adotada a preventiva.

De certa forma, conclui-se que o recall pode ser caracterizado como uma modalidade de garantia, uma vez que a lei assim a define. Vejamos o artigo 10, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor: “O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança. Parágrafo 1° O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários [...]”. 

Está configurada a garantia legal, sendo que a lei obriga a prestação da tutela. Apesar disso, grande parte dos motoristas não leva seus respectivos veículos para que seja feito o reparo do problema em questão, após serem notificados diretamente.

Garantia veicular

Na indústria automobilística, a garantia começa a vigorar a partir da entrega da documentação e do veículo, que, dependendo da marca, encontra-se no manual de instruções. Por isso é importante investir em manutenção preventiva dos principais equipamentos e sistemas importantes, que evitam situações de perigo e devem ser mantidos em boas condições.

O proprietário de veículo deve fazer todas as revisões conforme o manual do fabricante, garantindo a sua própria segurança e de terceiros, bem como o seu próprio veículo.

A tradição é a transmissão ou passagem de fatos ou de coisas, de pessoa a pessoa. Ou seja, quando a concessionária faz a entrega dos documentos e da chave do veículo, passa toda responsabilidade ao atual proprietário do veículo, criando um vínculo jurídico da obrigação de fazer as revisões, conforme seu manual, para a efetivação da garantia.

Assim, a garantia veicular inicia-se com a tradição, a entrega dos documentos e das chaves do veículo pela concessionária. A partir desse momento, o proprietário passa a ter o dever de fazer as revisões conforme o manual de cada montadora, para ter a garantia efetiva de seu veículo, de acordo com o Código do Consumidor. Além disso, é fundamental que os manuais sejam redigidos em português conforme determina a legislação, o que não ocorre em muitos segmentos não só o automobilístico.

Prescrição e decadência da garantia

O artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor supramencionado disciplina o prazo decadencial concedido ao consumidor para reclamar dos bens ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo, seja ele aparente ou oculto, por meio da garantia (troca ou manutenção do produto ou serviço prestado).

Já o artigo 27, do Código de Defesa do Consumidor, destaca o prazo prescricional, no qual disciplina a extinção do direito de exigir a reparação dos danos via judicial. Assim prevê: “Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria”. Portanto, seja qual for a modalidade de garantia, todas estão abalizadas pela decadência e prescrição.

O consumidor, por sua vez, tem de ficar atento no momento da compra de bens ou serviços, informando-se sobre a modalidade de garantia contratada, para que seus direitos sejam totalmente resguardados, atendendo à legislação vigente.

As causas que envolvem a garantia veicular, iniciam-se com a tradição, com a entrega dos documentos e das chaves do veículo na concessionária, a partir deste momento, o atual proprietário passa a ter o dever de fazer as revisões conforme manual de cada montadora, para ter a garantia efetiva de seu veículo, em face ao Código do Consumidor.

Fonte: Consultor Jurídico