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segunda-feira, 14 de abril de 2014

Telemarketing e torpedos põem à prova a paciência do consumidor no Brasil

Consumidores reclamam de mensagens indesejadas
no celular. Foto: Marcelo Carnaval / Agência O Globo

Se há uma unanimidade nacional é a falta de paciência do brasileiro com os abusos nas ligações de telemarketing e envio de torpedos que oferecem uma avalanche de produtos e serviços não solicitados. Escapar do operador do outro lado da linha ou bloquear os SMS indesejáveis, contudo, não é tarefa simples e exige determinação e uma verdadeira romaria por sites e números de telefone. No Brasil, apenas oito Estados - São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Paraná, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Paraíba e Goiás —, fora o Distrito Federal, contam com leis específicas para coibir tais práticas.

Rio e São Paulo têm leis sobre o assunto, mas que, na prática, se mostram insuficientes diante do número de queixas e reclamações dos usuários. No Rio, a lei 4.863, de 2006, garante a privacidade do consumidor quanto ao direito de não receber mensagens sem autorização. Em São Paulo, a lei 13.226, de 2008, normatiza o assunto, mas só em relação às chamadas de telemarketing - a proposta para inclusão dos SMS ainda está sendo elaborada. 

A assessora técnica da Fundação Procon-SP, Patrícia Alvarez, diz que o usuário pode fazer pessoalmente o bloqueio do número desejado no site da entidade, atualizado diariamente. Uma vez formalizada a queixa, o responsável pelo número reclamado tem 30 dias para suspender as ligações. Passado esse prazo, se o contato continuar, a empresa pode receber multas que vão de R$ 600 a R$ 7 milhões. Desde 2010, quando a lei entrou em vigor, já foram autuadas 307 empresas.

Em âmbito nacional, a resolução 477 da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) regula o tema. A agência, contudo, não tem estatísticas separadas sobre queixas de SMS e telemarketing, mas garante que 80% dos casos são solucionados em cinco dias úteis, e 95% no prazo de um ano. Em 2013, a Anatel recebeu 1,3 milhão de reclamações, a maioria por cobranças indevidas.

Sigilo de dados não é respeitado, diz especialista

A Anatel aponta que as operadoras de telefonia e TV paga têm um prazo de 120 dias, a contar de 10 de março deste ano, para informar de forma clara em seus sites os links para cancelamento automático de contrato e suspensão de envio de mensagens não autorizadas pelo cliente.

O diretor do Departamento Jurídico do Procon-RJ, Carlos Eduardo Amorim, diz que, para não ser importunado por mensagens publicitárias, o consumidor deve fazer constar, na assinatura do contrato com a operadora, que não deseja receber os SMS. Amorim alerta: ao receber no celular mensagem com mais de quatro dígitos, é quase certo que se trata de torpedo publicitário. As operadoras trabalham com três ou quatro dígitos.

"As reclamações têm crescido muito, a ponto de as ações apresentadas aos juizados especiais cíveis levarem mais tempo, às vezes, para serem julgadas do que na Justiça comum",  diz. Rosa Matsura, moradora do Maracanã, na Zona Norte do Rio, diz que desenvolveu uma tática própria para evitar as chamadas de telemarketing: "Na minha secretária eletrônica, vejo o prefixo da ligação. Se não for do Rio, não atendo. O problema é que, mesmo assim, deixam recado com ofertas de um monte de coisas que não me interessam".

Sheila Cruz, aeronauta e moradora do Leme, na Zona Sul, diz que já perdeu a conta do tempo perdido recebendo ofertas de cartão de crédito, planos de saúde, planos de TV por assinatura, horóscopo, notícias e até filtro purificador de água. "Eles ligam o dia inteiro, até à noite. Já tentei cancelar essas mensagens junto à Vivo, mas eles dizem que não podem suspender o serviço, porque consta do contrato", queixa-se Sheila.

Os operadores de telemarketing também reclamam. O diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações (Sinttel), Luiz Antonio Souza da Silva, diz que o abuso nas ligações prejudica os próprios operadores, que são submetidos a uma pressão grande para cumprir metas. Segundo ele, a categoria é mal remunerada e tem muitos casos de afastamento do trabalho por motivos de saúde: "O telemarketing hoje é praticamente terceirizado em todo o país. Duas empresas empregam 250 mil pessoas em todo o Brasil, 30 mil só no Rio. O sindicato também é contra esses abusos nas ligações. O fato é que falta fiscalização. Existe um comércio de venda de cadastros telefônicos, todo mundo sabe disso, mas ninguém faz nada".

O presidente do Instituto Brasileiro de Relações com o Cliente (IBRC), Alexandre Diogo, atribui a resistência às mudanças ao forte lobby político que as empresas de telemarketing têm no Brasil e ao reduzido número de estados que contam com legislação própria para inibir essas práticas. "Em São Paulo, por exemplo, a lei que normatiza as ligações de telemarketing foi aprovada pela Assembleia e vetada pelo Executivo. Só passou a valer porque o veto foi derrubado pelos parlamentares. Além disso, Procon estadual não pode notificar operadora de telemarketing com sede em estado que não tenha essa legislação. É um imbróglio jurídico."

Diogo não vê necessidade de leis complementares, já que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) considera essas práticas abusivas. Mas considera que o consumidor deve ser mais proativo e não ficar esperando que só o governo resolva problemas, com a criação de blogs que denunciem e identifiquem empresas, com boicote a produtos e serviços das companhias.

Segundo o presidente do IBRC, mais importante seria a pressão para que as empresas revelassem como obtiveram o contato do usuário: "O sigilo de dados não é respeitado no Brasil. É algo negociado como se fosse marca de bife. Eu mesmo recebo por dia de dez a 12 torpedos".

A presidente do Procon Brasil, Gisela Simona, diz que as dificuldades de bloqueio de celulares e telemarketing mostram a situação de fragilidade do consumidor em relação a seus direitos: "A aprovação do Marco Civil da Internet deveria ensejar um debate no Congresso sobre o tema".

A Claro afirma estar se adequando para cumprir as regras do novo regulamento da Anatel. Sobre o cancelamento de mensagens publicitárias, a empresa afirma já cumprir as determinações. A TIM diz que faz o cadastro para bloqueio de ligações de telemarketing nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Paraná, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Paraíba e no Distrito Federal e que os clientes podem recusar contatos da operadora, como telemarketing, torpedos promocionais e e-mail marketing.

A Telefônica Vivo informa cumprir a regra de envio de publicidade apenas com autorização prévia do consumidor, oferecendo no contrato a opção de recebimento ou não de conteúdo via SMS. Já a Oi diz cumprir a norma da Anatel sobre ligações e envio de mensagens promocionais e que casos de dificuldades no cancelamento de chamadas e SMS serão apurados pela empresa. A GVT, por sua vez, afirma que os procedimentos para cancelamento do contrato estão no site.

O que fazer?

SMS e ligações: A resolução 477 da Anatel, de 2007, e a lei estadual 4.863, de 2006, garantem ao cliente optar por receber ou não mensagens de texto e solicitar a suspensão do serviço. Queixas pelo telefone 1331 ou no site da agência (www.anatel.gov.br).

Contrato: A Anatel aprovou, em 20 de fevereiro, norma que garante, a partir de julho, cancelamento automático do contrato de telefonia, banda larga ou TV por assinatura. A operadora terá até dois dias úteis para efetivar a decisão. Em cancelamento via atendente, o serviço deve ser encerrado de imediato.

Claro: Para cancelar o recebimento de mensagens e serviços, o cliente deve enviar a palavra “sair” para 888, ou solicitar o bloqueio pelo canal 1052.

TIM: Sobre torpedo/SMS promocional, o cliente pré-pago é perguntado se quer recebê-los ao realizar a primeira ligação. Também é possível solicitar bloqueio enviando SMS com a palavra “sair” para o 4112 ou ligando para *144.

Oi: Basta enviar SMS com a palavra “sair” para o número 55555 ou desativar o serviço pelo portal de relacionamento Minha Oi.

Vivo: O cancelamento de SMS pode ser feito pelo portal www.vivo.com.br, pelo *8486, nas lojas e até por SMS.

GVT: Suspensão do contrato pode ser feita pelo site  www.gvt.com.br/portal/site/minhagvt/faleComGvt

Fonte: O Globo

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